VENDA NOVA TRIcentenária - um carnaval de presente
Apresentação
O GRES Acadêmicos de Venda Nova nasceu em 01 de dezembro de 2004 pela união de diversas famílias e amigos da região, com o intuito de louvar o samba, as artes carnavalescas e manter as tradições belo-horizontinas dos desfiles das escolas de samba. Seus símbolos são Fênix e pandeiro, suas cores azul e rosa.
Numa curta trajetória nos desfiles das escolas de samba de Belo Horizonte, o GRES Acadêmicos de Venda Nova apresentará o seu 7o. desfile carnavalesco, caminho este iniciado em 2005 e premiado com dois campeonatos e outras três vice-colocações.
Tal resultado é o fruto de um trabalho de base realizado com muito amor, respeito e dedicação em nossa comunidade, onde identificamos os talentosos moradores e os instruímos nas práticas carnavalescas da percussão, dança, artes plásticas e composição musical.
Nossa grande motivação para este carnaval de 2011 será a comemoração dos históricos 300 anos de ocupação de nossa região, cantada através do enredo "VENDA NOVA TRIcentenária - um carnaval de presente".
Inspirados no mineiro Carlos Drummond de Andrade, no seu poema "No meio do caminho", homenagearemos a verdadeira riqueza de nossa região: o povo, que chegou e fez de Venda Nova referência em hospitalidade e generosidade aos visitantes e novos moradores que para cá vieram e escolheram viver nestas terras, outrora simples caminho para a vila mineradora de Sabará e, hoje, pulsante pólo comercial, administrativo e de serviços de nossa cidade.
A você, seus costumes, tradições e anseios por mais dignidade social, dedicamos carinhosamente um espetáculo de carnaval como presente, criado por muitas mãos vendanovenses especialmente para esta noite. Desejamos a esta população, trabalhadora e sofrida, outros 300 anos no pelo usufruto da cidadania e da dignidade pessoal.
Viva o povo de Venda Nova!!
Caminhos
O que haverá em comum entre a heróica proteção de um caminho na Grécia em 480(a.C.) e o início do povoamento de nossa Venda Nova, um dos caminhos entre os sertões e a Vila de Sabará, cerca de 2.200 anos depois?
Através de pesquisas e análises realizadas pela nossa Acadêmicos de Venda Nova, concluímos que ambos os acontecimentos foram marcados pelo derramamento de sangue, pela tentativa de defender e/ou formar uma identidade social e cultural, e pela relevante contribuição de novos elementos históricos que contribuíram para a evolução da nossa civilização ocidental.
Falando em caminhos, travessias e transformações, buscamos da memória o poema "No meio do caminho", publicado em 1928 pelo imortal mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), que elevou uma metafórica "pedra" ao patamar de um obstáculo necessário e fundamental ao crescimento e desenvolvimento, um marco, o que nos impede e ao mesmo tempo nos impulsiona a atravessar um caminho escolhido para percorrer. Esta pedra nos força a refletir, alterar nossa trajetória, buscar novos meios e alcançar outras oportunidades, possibilidades, enfim outros caminhos.
Leia o poema na sua íntegra:
No meio do caminho (Carlos Drummond de Andrade 1902-1987)
No meio do caminho tinha uma pedra,
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
Tinha uma pedra e ela já estava lá antes que a encontrássemos. E isso só é possível porque nos pomos a caminho, já estamos no meio desta estrada, nos instauramos neste mundo e buscamos o que somos. Se estas pedras não podem ser mudadas, pode-se inventar novas posições e ocupar novos lugares diante delas. Sábio poeta.
No verão de 480(a.C.), na Grécia central travou-se a sangrenta Batalha das Termópilas, onde cerca de 7.500 mil gregos tentaram impedir o avanço do exército persa, de aproximadamente 250 mil guerreiros, por um caminho entre o mar e o desfiladeiro das Termópilas. Deste grupo destacaram-se 300 guerreiros da cidade-estado grega Esparta (os 300 de Esparta), comandados por seu rei Leônidas I, os últimos bravos a sucumbirem ao avanço do imenso e esmagador contingente liderado pelo rei Xérxes, filho de Dario I.
Ao relatar este episódio, o historiador grego Heródoto de Halicarnasso descreve uma batalha cruel com perdas consideráveis para ambos os lados, inclusive da quase totalidade do contingente helênico (grego), que naquele caminho foi trucidado. Apesar do fatídico acontecimento, durante o período que durou o bloqueio, foi fundamental para a salvação e proteção das cidades gregas, inclusive Atenas. Heródoto observou que, graças à duração das guerras, pôde se proteger a cultura grega (helênica), base da civilização ocidental como a conhecemos hoje. Muitas vidas se perderam e o caminho ficou manchado pelo sangue dos bravos guerreiros e dos invasores do oriente.
Passados cerca de 2.200 anos deste episódio, vemos surgir no interior das Américas, em terras de abundantes riquezas minerais e de vida natural rica e diversificada, muitos caminhos que proporcionaram o escoamento de mercadorias, gado, riquezas e toda sorte de pessoas, tropeiros e viajantes que neles trafegaram, atravessando o sertão para chegar à rica Vila de Sabará. Por estas trilhas também muito sangue foi derramado em nome da ambição e da dominação, tal a epopéia dos “300 de Esparta“.
Venda Nova é assim, uma das pedra de Carlos Drummond de Andrade, no meio do caminho, por onde a história das Geraes atravessou e se consolidou a medida que, por aqui, muitos desviaram dos seus trajetos, fizeram pousada, trouxeram novos hábitos e levaram um pouco dos nossos costumes para a formação da cultura mineira.
Carreta, Estrada do Carretão, Rua Direita... (Antigos nomes de Venda Nova)
Segundo a tradição oral, Venda Nova completará 300 anos em 13 de julho de 2011, tendo começado a ser povoada por volta do ano de 1711, como pouso de tropeiros que por aqui passavam com gados e mercadorias vindos do nordeste da colônia, seguindo o Rio São Francisco e depois o Rio das Velhas, para abastecerem as minas de ouro em Sabará, mas "...no meio do caminho tinha uma pedra...".
Num desses muitos caminhos que chegavam a um dos principais centros mineradores da colônia, nasceu o povoado de Venda Nova. A região era esplêndida pela mata que a cobria, contando inclusive com variedade das espécies da flora, como jacarandás, braúnas, aroeiras, cipós-de-são-João, maracujás, e da fauna com seus belos pássaros, cervídeos, répteis. Grande extensão de suas terras era cortada pelo Córrego Vilarinho, que se alargava feito mar nas épocas das fartas chuvas.
Ao redor desse caminho foram-se instalando pequenos sítios e fazendas, moradias, comércios, estábulos e, com o passar do tempo, uma série de outros serviços e benfeitorias. Muitas das mercadorias cruzavam o caminho nas costas dos animais de carga, passavam também os rebanhos que supriam Sabará.
Terra cobiçada por muitos, Venda Nova já pertenceu a Sabará, Santa Luzia, Campanha (atual Ribeirão das Neves), Curral Del'Rey e finalmente, em 1948, tornou-se definitivamente um distrito de Belo Horizonte.
O mais antigo documento conhecido sobre Venda Nova é a solicitação de uma licença para o funcionamento de uma "Venda" em 1781. No início do povoamento, as principais atividades eram o comércio, agricultura e pecuária. Em 1787, a “rainha louca” de Portugal, dona Maria I, recebeu um pedido formal de populares para se erguer uma capela de invocação a Santo Antônio, resposta da concessão chegou mais de uma década depois.
Não se tem certeza do motivo do nome Venda Nova. Consta da tradição oral que um comerciante construiu uma "venda" maior e mais bem feita e que então os viajantes falavam "- vamos parar naquela venda nova", e o nome se popularizou. Venda é o nome "mineirado" dos armazéns e pequenos empórios das montanhas gerais.
Durante 200 anos Venda Nova viu o tempo passar bem lentamente pelas suas janelas e sombras das árvores. O vai e vem dos tropeiros e rebanhos cortava o silêncio do lugar, vez ou outra quando passavam. Sua paisagem era basicamente formada por matas, plantações tradicionais e áreas de pasto.
Pouco a pouco o caminho foi se alargando, sendo conhecido inicialmente como "Carreta" e depois "Estrada do Carretão" e "Rua Direita", a atual rua Padre Pedro Pinto. Foi o palco das principais manifestações religiosas, sociais, culturais, políticas e de lazer na região. Suas tradicionais festas de Santo Antônio, o padroeiro primeiro, São Pedro, festas de maio à Virgem Maria e a Folia de reis, atraíam pessoas de todas as partes e eram de grande clamor popular.
Ao redor do caminho foram surgindo outros caminhos como o das "Pedrinhas" e do "Cerrado". Foram se estruturando as vendas e armazéns, surgiu o Cine Teatro São Pedro, a sede dos "calangos do cerrado" como era conhecido o Venda Nova Futebol Clube, o salão de danças que funcionava na sede do Botafogo Futebol Clube, os bailes ao som da Corporação Musical de Santo Antônio e do Conjunto Musical Marabá, e tempos depois o saudoso “Baile da Saudade“. Lembranças de um bairro ainda isolado da novíssima Capital, com suas ruas tranquilas e seu povo de espírito brejeiro, porém animado e político.
No ritmo do desenvolvimento de Belo Horizonte, com a inauguração do Complexo Turístico da Pampulha, incluindo o seu aeroporto, Venda Nova recebe uma ligação viária mais moderna ao centro da cidade e torna-se distrito em 1948, quando foi definitivamente anexada a capital, pelas crescentes necessidades de novas áreas para ocupação e construção de residências populares.
Nos anos seguintes, no rastro do crescimento desordenado da população, espaços verdejantes foram substituídos por aglomerados de casas e bairros inteiros. Aos poucos também foram embora o bucolismo dos ribeirões de águas cristalinas onde se podia nadar e pescar e outros tantos recantos naturais, abrigo dos piqueniques e passeios dos finais de semana.
Os moços não mais fizeram o "footing" nas tardes de domingo. Não mais houve as matinês no cineminha. Derrubaram a primeira capelinha, depois a antiga Matriz de Santo Antônio e, mais uma vez, derrubaram a nova Matriz do mesmo Santo. Hoje o Santo é inquilino da antiga Escola Municipal Padre Lebret, e somos órfãos de um templo "próprio" dedicado ao padroeiro.
O saudoso padre Pedro Pinto Fernandes e seu Ford-1928, nossas "rainhas da Rádio Nacional" Neide e Nancy, o artesão Miro, a parteira Dona Leonina, o Grupo Escolar Santos Dumont, a Capela do Sagrado Coração de Jesus, os imigrantes japoneses da Granja Mikado, os portugueses, os italianos, os alemães, os espanhóis e outros. Bola de meia, bente alta, peladinha, cavalos de pau, bonecas de pano e palha de milho, peão, pula corda, cobra cega... Tudo e todos agora só na memória.
Os bailes de outrora cederam lugar a música eletrônica que soa retumbante das quadras Vilarinho, lar do lendário Capeta do Vilarinho, rapaz sedutor que esconde sob o chapéu um par de chifres e um rabo debaixo da capa. Ele é o rei da night. E tem mais, muito forró, sertanejo, pagode e funk ecoando das casas noturnas, restaurantes e bares da região ao sabor da cerveja, a bebida preferida.
Hoje Venda Nova é Babel. Misturam-se aqui povos de diversas nacionalidades e origens, brasileiros de todos os cantos. O sertão não mais é um "desertão", agora todos os seus espaços estão ocupados. A região cresceu e se subdividiu em atuais 44 bairros. Em Venda Nova mantém-se a sede, no São João Batista nasceu a nossa Escola de Samba, o Serra Verde se explicava pelo próprio nome, além de sediar o Centro Administrativo de Minas Gerais, outrora Jóquei Clube.
De acordo com o senso de 2000 somamos mais de 242 mil habitantes, espremidos numa área de 27,8km2 e abrigamos aproximadamente 218 mil eleitores (para eleição de 2010). O vendanovense ainda necessita de melhorias na sua qualidade de vida, mais segurança, saneamento básico, transporte público eficiente, unidades especializadas de educação, lazer e cultura diversificada para proporcionar outras realidades a uma população que ainda lota os ônibus coletivos e os vagões do metrô, que conta com apenas uma estação aqui, rumo às diversas regiões de Belo Horizonte, em busca de produtos e serviços mais especializados.
O que oferecer a esta população maravilhosa, sofrida e trabalhadora? O presente da nossa Escola de Samba é um emocionante carnaval em homenagem ao vendanovense, personagem principal desses 300 anos de história. Desejamos-lhes votos de outros 300 séculos com mais dignidade e cidadania plenas.
O Fênix da nossa Acadêmicos de Venda Nova, renascendo das suas próprias cinzas, evoca o espírito desbravador, esperançoso, consciente e libertário, qualidades que marcaram nossos antepassados, para desvendar bons caminhos que tornem nossa Venda Nova realmente melhor para todos nós.
Viva o povo de Venda Nova!!
Belo Horizonte, setembro de 2010.
GRES Acadêmicos de Venda Nova
Diretoria artística
Agradecimentos especiais
• Ana Maria da Silva (Centro Cultural Venda Nova);
• Na figura do morador sr. José Martins, agradecemos a todos os amigos que contribuíram com suas memórias em depoimentos sobre Venda Nova.
Bibliografia
• SILVA, Ana Maria da. Lembranças... Venda Nova. Belo Horizonte: 2000.
• PAIVA, Eduardo França. Venda Nova Séculos XVII e XIX Um estudo de história regional. Belo Horizonte: 1992.
• PBH, Assessoria de comunicação. História de Venda Nova em contos e causos narrados para crianças e jovens. Belo Horizonte: 2003.
• PBH, Assessoria de comunicação. História de Venda Nova em contos e causos narrados para crianças e jovens Volume II. Belo Horizonte: 2005.
• http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.do?evento=portlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal&app=regionalvendanova&tax=9120&lang=pt_BR&pg=5486&taxp=0&
• http://pt.wikipedia.org/wiki/Venda_Nova_%28regi%C3%A3o_de_Belo_Horizonte%29
• Depoimentos e relatos orais de moradores da região.